Isenção de tributação incidente sobre discos de vinil
Analisando a questão sob enfoque jurídico, verifica-se que a Constituição Federal garante em seu art. 5º. a igualdade perante a lei (princípio da isonomia), e no inciso XIII do mesmo artigo a liberdade de ação profissional (direito individual). Atribui à União a competência de tributar a importação de produtos estrangeiros (art. 153, I). Também estatui a nossa Carta Magna em seu art. 179 que a ordem econômica é fundamentada na valorização do trabalho, observados, dentre outros, os princípios da livre concorrência, redução das desigualdades sociais e regionais e busca do pleno emprego (incisos IV, VII e VIII). No Parágrafo único do mesmo artigo, a Constituição assegura a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica.
A nossa legislação infra-constitucional (Código Tributário Nacional) atribui ao Poder Executivo a possibilidade de alterar alíquotas e bases de cálculo, nos limites da lei (art. 21). O art. 176 do mesmo diploma legal condiciona a concessão de isenção à criação de lei.
Um dispositivo importante a favor do pleito contra a supertaxação é o Decreto Lei no. 37/66, que regulamenta o Imposto de Importação, pois em seu art. 17 estabelece que a isenção do Imposto de Importação somente beneficia produto sem similar nacional em condições de substituir o importado. Para o julgamento da similaridade, o art. 18 do mesmo Decreto confere ao Conselho de Política Aduaneira o dever de formular critérios, gerais ou específicos, para julgamento da similaridade. O referido Conselho observará as seguintes normas básicas:
“I - preço não superior ao custo de importação em reais do similar estrangeiro);
II - prazo de entrega normal ou corrente para o mesmo tipo de mercadoria;
III - qualidade equivalente e especificações adequadas”.
O disposto no Decreto-Lei no. 37/66 também coaduna com o pleito pró-vinil, pois se o mesmo concede isenção a produtos sem similar nacional, é perfeitamente viável a inclusão dos discos de vinil no caso do art. 17 (produto sem similar nacional). Para isso cabe ao Conselho de Política Aduaneira o julgamento da similaridade, procedimento sujeito às normas administrativas. Tal premissa é procedente devido à ausência de nossa indústria fonográfica nacional no mercado do disco de vinil, assim como os obstáculos financeiros impostos imotivadamente para a profissão de disc jockey (DJ). A função precípua do Imposto de Importação é harmonizar conflitos de comércio internacional (por isso é chamado de extrafiscal). Assim, o legislador lança mão desse recurso principalmente quando quer estimular as vendas de produtos nacionais, em detrimento de produtos importados.
Isso significa que a campanha contra a taxação do disco de vinil condiz sobretudo com nosso preceito constitucional da isonomia (art. 5º. da Constituição Federal), que inclui a igualdade tributária, que no dizer do ilustre constitucionalista José Afonso da Silva:
“É necessário ter em vista que o sistema tributário é parte de um sistema econômico-social concreto, e qualquer teoria de uma tributação justa que não leve em conta a totalidade do sistema cai na abstração metafísica. (...) Não basta, pois, a regra de isonomia estabelecida no caput do art. 5º., para concluir que a igualdade perante a tributação está garantida. O constituinte teve consciência de sua insuficiência, tanto estabeleceu que ‘é vedado instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos (art. 150, II)”
O mesmo autor ressalta o dispositivo contido no art. 145, §1º. da Constituição, cuja regra é sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte.
No tocante à isonomia tributária, em concordância com o já citado José Afonso da Silva, o eminente Ruy Barbosa Nogueira preleciona que:
“Somente o imposto que seja organizado segundo princípios idênticos para todos que estejam vinculados às mesmas situações, isto é, de proporcionalidade à capacidade econômica de cada um, responde ao princípio de igualdade de direito e de justiça fiscal”.
Além do exposto, à guisa da Constituição, que purga pela valorização do trabalho pela ordem econômica e eleva como princípio o da busca pelo pleno emprego, a legislação federal (Código Tributário Nacional e Decreto-Lei no. 37/66) abarca a tese da aludida campanha.
O cenário atual, além de prejudicar a livre atividade econômica e o livre exercício profissional previstos na Constituição, de certo modo obsta a evolução cultural do Brasil como um todo, pois está repassando para toda uma classe artística um ônus financeiro além de sua capacidade contributiva, somando ao fato de que o disco de vinil é uma ameaça para a indústria nacional que produz unicamente compact discs, distorcendo como foi visto, a finalidade do imposto, que é extrafiscal.
O vinil já foi considerado um bem cultural como são os livros, sem taxação de impostos. Nos anos 90, devido aos softwares de computador que também usavam como mídia os CDs, passaram a ser taxados e os discos de vinil também foram incluídos.